CONCEITUANDO ARTE VERBAL DE VANGUARDA — ANIMAVERBIVOCOVISUALIDADE
Texto de Antonio Miranda
A minha geração conviveu com os movimentos de vanguarda mais extremados e criativos que o Brasil já experimentou. Vimos a maturidade do modernismo e abraçamos a geometria da arquitetura moderna que culminou na construção e inauguração de Brasília; vimos o Cinema Novo triunfar com sua estética da fome nos festivais internacionais e assistimos a consagração mundial da Bossa Nova. Sem esquecer os extremismos das esquerdas e as primeiras glórias mundiais de nosso futebol! E houve o Manifesto da Poesia Concreta dos irmãos Augusto e Haroldo de Campos, Décio Pignatari e seguidores, que revolucionou as nossas artes plásticas e abalou o versilibrismo modernista. Foi uma ruptura tão espetacular quanto foi a dos modernistas de 1922 no desmoronamento das bases parnasianas das letras em seu tempo.
Muita gente vai achar que eu estou exagerando. Vai dizer que o modernismo nos deu os nomes mais notáveis de nossa cultura do século XX. Sem dúvida. Mas os concretistas foram ainda mais universais na sua proposta do que o nacionalismo dos antropofagistas e, em certa medida, foram os precursores de um conceito de integração das artes que só iria dar seus frutos definitivos na virada do século, no espaço da web, e em escala planetária.
Estive orientando um pós-doutorando no levantamento das origens e das consequências das vanguardas poéticas no Brasil, experiências que estão sendo agora recicladas e rotuladas sob o rótulo mais genérico de Poesia Visual. As contribuições teóricas e os produtos dessas experimentações estão em livros, nas galerias de arte, frequentam os espetáculos musicais, as performances de artistas, surgem em instalações artísticas efêmeras, nos videoclips, nas páginas e blogs na Internet como artes virtuais. E crescem exponencialmente em todo o mundo. Quem duvidar que entre no Google e coloque como tema de pesquisa os unitermos Poesia Visual, Visual Poetry e nas línguas ao seu alcance e vai levar um susto! Sem falar nas sinonímias...
Uma das questões que começo a pesquisar é a repercussão dos poetas concretistas brasileiros e seus sucedâneos no mundo. É impressionante como são reconhecidos, referenciados e reverenciados nas exposições de Poesia Visual nos Estados Unidos da América e na Europa! Santo de casa não faz milagre...
Muitas reportagens, ensaios e até livros certamente vão continuar surgindo sobre o tema. A poesia discursiva não vai perder espaço por causa disso, vai continuar a expandir-se na e fora da Internet. Paralelamente, os poetas visuais continuarão multiplicando-se e surpreendendo-nos com o domínio da criação e do uso das tecnologias.
Os mais reacionários vão continuar achando que não se trata de poesia. Outros defenderão a tese monopolista de que só existe poesia na literatura enquanto outros buscarão poesia em outras artes e linguagens, no hibridismo próprio do pensamento complexo que norteia as ciências e as artes pós-modernas.
Nos anos 50 eu já era um poeta discursivo conforme os modelos ao meu alcance e continuo na mesma trajetória, assimilando e criando estilos. Mas, como tantos outros poetas de minha geração, fiz as minhas experiências nos moldes do concretismo e do neoconcretismo. Adotei o pseudônimo de Da Nirham Eros e cheguei a publicar no SDJB, a expor no Brasil, na Argentina e na Venezuela os meus “poegoespaços” e participei dos grupos Integración e Madi. O poegoespacialismo foi reconhecido pelo crítico Roberto Pontual como renovador. Eu preferi depois usar um termo mais abrangente – Arte Verbal de Vanguarda - numa exposição e num curso que promovi em Buenos Aires, em 1962, no sentido de associar aquelas criações às artes plásticas e poéticas integradas, como hoje em dia é uma associação natural entre os praticantes da Poesia Visual.
Cabe ressaltar que este foi o tema da tese de doutorado de Elmira Simeão, em 2008, que ela publicou em formato de livro, já disponível para os interessados.
Outubro 2025
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